CAPÍTULO 10 O Yoga da Manifestação Divina

Disse o Senhor Bendito:

10.1 Além disso, ó [Arjuna] dos braços fortes, ouve Minha palavra suprema. Vou declará-la a ti [que és Meu] bem-amado, pois desejo [o teu] bem.

10.2 Nem os exércitos dos deuses nem os grandes videntes conhecem a Minha origem, pois sou o princípio dos deuses e dos grandes videntes [e de todas as outras entidades] em toda parte.

10.3 Quem conhece a Mim, o Grande Senhor do mundo, como não nascido e sem princípio, não [vive] perplexo entre os mortais, [mas] é libertado de todos os pecados.

10.4 Sabedoria, conhecimento, ausência-de-perplexidade, paciência, veracidade, comedimento, tranquilidade, prazer, dor, vir-a-ser [ou nascimento], não vir a ser [ou morte], medo e também destemor;

10.5 não violência (ahimsā), equanimidade, contentamento, ascese, caridade, boa e má reputação – [tais são] os estados-de-existência (bhāva) dos seres [que], com efeito, surgem de Mim [em toda a sua] diversidade.

10.6 Os sete grande videntes de outrora 1Os sete grandes videntes são geralmente identificados como Kashyapa, Atri, Vasishtha, Vishvāmitra, Gautama, Jamadagni e Bharadvāja., como também os quatro Manus 2 Os quatro Manus (ver a nota 2 em 4.1) fazem parte de uma sequência de quatorze.Os sete primeiros foram Svāyambhuva (o Manu original), Svārocisha, Auttama, Tāmasa, Raivata, Cākshusha e, em sétimo lugar, o Manu Vaivasvata (progenitor da raça humana atual e regente do manvantara, ou Era de Manu, em que vivemos), cujo reinado terminará daqui a uns 2 milhões de anos. Depois dele haverá sete outros Manus, e então o universo desaparecerá completamente com a morte de Brahma, o atual criador. (Svāyambhuva é o legislador mencionado na nota 4 em 5.18.)  [que partilham do] Meu estado-deexistência nasceram da Minha mente; deles [surgiu] o mundo [com todas] estas criaturas.

10.7 Quem verdadeiramente conhece este Meu poder-de manifestação 3Zaehner (1966) traduz vibhūti como “poder extenso”; Nataraja Guru (1973), como “valor único”; Radhakrishnan (1948), como “glória”; e Edgerton (1944) propõe “manifestação superna”. Hill (1928/1966) comenta com razão que essa palavra “contém uma ideia de ‘poder’ ou ‘senhorio’ e também uma ideia de ‘penetração’ ou ‘imanência’”. e Yoga é jungido por um Yoga inabalável.

Quanto a isso não há dúvida.

10.8 Eu sou a origem de tudo. De Mim tudo surge. Diante disso, os sábios dotados do estado-de-existência 4Zaehner (1966) traduz o termo bhāva (“estado-de-existência”), nesse caso, por “caloroso afeto”, enquanto Bhaktivedanta Swami (1983) o traduz por “de todo o coração”. Shankara o explica como bhāvanā paramārthatattvābhiniveśah, ou seja, “cultivo: direcionamento da atenção para a Realidade transcendente”. Entendido como “estado-deexistência”, o termo bhāva denota o estado psicológico de abertura à realidade última, estado esse que é fundamental para o Yoga. [apropriado] Me adoram.

10.9 Com a mente voltada para Mim, a força vital dissolvida 5A palavra gata (“ida”, particípio passado [feminino] do verbo “ir”), traduzida aqui como “dissolvida”, também pode significar “absorvida” ou “absorta [em Mim]”. Uma tradução mais devocional da oração inteira seria “a força vital [ou: a vida deles] entregue a Mim”. em Mim, esclarecendo uns aos outros e falando constantemente de Mim – eles estão contentes e regozijamse.

10.10 A esses [sábios] sempre jungidos [que Me] adoram com afeição, concedo aquele buddhi-yoga 6 O composto buddhi-yoga, não traduzido nesse caso, tem muitas conotações. Refere-se à capacidade yogue de sabedoria ou à capacidade de exercitar, pela graça de Krishna, a faculdade inata da sabedoria. pelo qual se aproximam de Mim.

10.11 Por compaixão (anukampā) por esses [sábios], dissipo pela lâmpada brilhante do conhecimento a escuridão nascida da ignorância, permanecendo [sempre] em Meu Próprio estadode-existência.

Arjuna disse:

10.12 És o supremo Brahman, a morada suprema, o purificador supremo, o eterno Espírito divino, o Deus primordial, não nascido, onipresente.

10.13 [Assim] falam de Ti todos os videntes e também o divino vidente Nārada 7Nārada, um dos mais famosos sábios mencionados nos Purānas, teve, segundo o épico, sete nascimentos eminentes. Como filho do rei Drumila e da rainha Kalāvatī, recebeu os ensinamentos do bhagavatismo diretamente de Vishnu., Asita Devala 8Asita Devala é o nome de um sábio mencionado em outros trechos do Mahābhārata como um dos discípulos de Vyāsa. Ele foi responsável por disseminar o épico entre o público em geral. Edgerton (1944) conclui, erroneamente, que Asita e Devala foram dois sábios diferentes. e Vyāsa 9Aqui, Vyāsa, criador de todo o Mahābhārata, inteligentemente menciona a si mesmo dentro da sua própria criação.; e Tu Mesmo me dizes isso.

10.14 Considero verdadeiro (rita) tudo isso que Me dizes, ó Keshava 10Sobre o epíteto Keshava, ver a nota 21 em 1.31.. Com efeito, ó Bendito, nem os deuses nem os demônios conhecem [esta] Tua [forma] manifesta.

10.15 Tu Mesmo conheces a Ti Mesmo por Ti Mesmo, ó Espírito Supremo, gerador dos seres, Senhor dos seres, Deus dos deuses, ordenador do universo.

10.16 Deves informar[-me], sem nada esconder, [sobre os] poderes-de-manifestação (vibhūti) do [Teu] divino Si Mesmo, poderes por meio dos quais habitas nestes mundos, penetrando[-os].

10.17 [Embora] reflita sempre em Ti, de que modo devo conhecer[Te], ó Yogin? 11Aqui, Arjuna refere-se a Sri Krishna como o supremo yogin, aquele que realizou e personifica o objetivo máximo do Yoga. (N.T.) E em quais dos muitos estados-de existência devo pensar em Ti, ó Bendito? 12Uma tradução alternativa dessa frase, baseada nas interpretações clássicas: “Em que forma de manifestação [ou: em quais aspectos] devo pensar em Ti, ó Bendito?”. Em seguida, Sri Krishna arrola para Arjuna as diversas formas gloriosas em que se manifesta em todo o universo, formas essas que podem servir de objeto de meditação para o yogin que volta sua atenção para o Senhor Bendito. (N.T.) 10.18 Fala-me de novo extensamente, ó Janārdana 13 Sobre o epíteto Janārdana, ver a nota 25 em 1.36., sobre o Yoga e o poder–de-manifestação de Ti Mesmo, pois não me saciei de ouvir o néctar [das Tuas palavras].

Disse o Senhor Bendito:

10.19 Eis que vou declarar-te os principais poderes-de manifestação do [Meu] divino Si Mesmo, ó Kurushreshtha 14Kurushreshtha é um epíteto de Arjuna e significa “O Melhor dos Kurus”., [pois] Minha extensão não tem fim.

10.20 Eu sou o Si Mesmo (ātman), Gudākesha 15Sobre o epíteto Gudākesha, aplicado a Arjuna, ver a nota 17 em 1.24., que subsiste no lugar-de-repouso 16A palavra āshaya, traduzida aqui como “lugar de repouso”, é derivada da raiz verbal shī (“reclinar”). Esotericamente, refere-se ao coração. de todos os seres. Sou o princípio, o meio e o fim de [todos os] seres.

10.21 Entre os Ādityas 17De certo ponto de vista, Vishnu é uma grande divindade solar, o líder dos Ādityas. Os Ādityas, filhos de Aditi (que representa o espaço ilimitado), são as divindades solares  védicas Varuna, Mitra, Aryamat, Bhaga, Daksha e Amsha. Às vezes, enumeram-se doze Ādityas., sou Vishnu; entre os luminares, o Sol radiante. Entre os Maruts 18Os Maruts, os 21 filhos guerreiros do deus védico Rudra (“Uivador”), são associados ao vento. No Hari-Vamsha (“Linhagem de Hari [Krishna]”), volumoso apêndice tradicional ao Mahābhārata, 24 Maruts são mencionados pelo nome, e outros textos mencionam um número ainda maior., sou Marīci 19 Marīci, líder dos Maruts, é ligado às tempestades de raios.; entre as mansões lunares 20 O termo nakshatra, geralmente traduzido por “constelações”, refere-se aqui às 27 (posteriormente, 28) mansões lunares (divisões do caminho da Lua na astrologia védica), que correspondem a outras tantas constelações estelares., a Lua.

10.22 Sou o Sāma-Veda entre os Vedas. Sou Vāsava 21Vāsava é um dos nomes de Indra. entre os deuses, a mente entre os sentidos 22A mente (manas) é geralmente chamada de 11º sentido (indriya), pois é ela que processa todos os dados sensoriais.. Sou a senciência (cetanā) entre os seres.

10.23 E sou Shamkara 23Shamkara (“Pacificador”) é o primeiro dos Rudras, que geralmente são contados como onze, embora o Mahābhārata (13.984) diga que são 1.100. São, às vezes, identificados com os Maruts. Shamkara também é um dos nomes de Shiva. Ver também a nota 7 em 11.6. entre os Rudras, o Senhor das Riquezas entre os Yakshas 24Os Yakshas são espíritos da natureza, geralmente representados como anões barrigudos. O senhor das riquezas (vittesha) é mais conhecido como Kubera. e Rākshasas 25Os Rākshasas são ogros destruidores que gostam especialmente de interromper os sacrifícios e outras atividades sagradas. e o fogo entre os Vasus 26Os oito Vasus (“Habitantes”) são divindades associadas ao espaço e aos elementos. Segundo o Mahābhārata, são Dharā (a terra), Dhruva (a Estrela Polar, que representa as mansões lunares ou constelações), Soma (a Lua), Aha (as águas), Anila (o vento), Anala (o fogo), Pratyūsha (o Sol) e Prabhāsa (o céu).. Sou Meru 27De acordo com a mitologia hindu, o Monte Meru é a montanha sagrada situada no centro de Jambudvīpa (a ilha habitada, ou seja, a Terra). É o axis mundi (eixo do mundo), feito inteiramente de ouro. Jambudvīpa é um dos sete “continentes” que compõem o universo conhecido. No simbolismo yogue, Meru representa a coluna vertebral, ao longo da qual o “poder serpentino” (kundalinī-shakti) deve subir para que o praticante alcance a iluminação. entre as montanhas.

10.24 Conhece-me como Brihaspati 28Brihaspati (“Grande Pai/Senhor”) é o sumo sacerdote das divindades e é associado ao planeta Júpiter., o principal entre os sacerdotes domésticos, ó filho-de-Prithā 29Sobre o epíteto “filho-de-Prithā” (Pārtha), ver a nota 18 em 1.25.. Sou Skanda 30Skanda é um dos filhos de Shiva. Divindade guerreira, Skanda é associado ao planeta Marte. entre os comandantes e o oceano entre os corpos d’água.

10.25 Sou Bhrigu 31Bhrigu é um dos sábios mais famosos dos tempos antigos. De acordo com a mitologia, esse sábio poderoso ousou dar um pontapé em Vishnu para acordá-lo. Vishnu não se irritou, mas abraçou, amoroso, o pé que o chutara; Bhrigu converteu-se então em fervoroso devoto de Vishnu. entre os grandes videntes. Entre as elocuções, sou o monossílabo 32Sobre o monossílabo OM, ou AUM, ver a nota 14 em 8.13.. Entre os sacrifícios, sou o sacrifício da recitação, e o Himalaia entre as [coisas] imóveis.

10.26 [Sou] ashvattha 33A árvore ashvattha é a Ficus religiosa, também conhecida como pipal ou figueirados-pagodes. Ver a extensa nota de Hill (1928/1966, p. 185s.) sobre a estrofe 15.1 (citada em parte, abaixo, na nota 1 em 15.1). A ashvatta simboliza o mundo da mudança (samsāra). entre todas as árvores e Nārada entre os divinos videntes. [Sou] Citraratha 34 Citraratha é o chefe dos Gandharvas. entre os Gandharvas 35Os Gandharvas (“Fragrâncias”) são espíritos celestiais masculinos e são associados ao deus do Sol, que muitas vezes é contado como um deles. São viris e, de acordo com a mitologia purânica, benevolentes. São os “anjos guardiães” da música, do canto e da dança. e o sábio Kapila 36Kapila é tradicionalmente celebrado como o fundador da tradição do Sāmkhya. entre os perfeitos.

10.27 Entre os cavalos, estejas ciente de que sou Uccaihshravas 37Uccaihshravas é o cavalo de Indra., nascido do néctar; [sou] Airavata 38Airavata é o elefante de Indra. Como Uccaihshravas, surgiu quando o oceano cósmico foi agitado pelos deuses e antideuses (titãs). entre os elefantes senhoriais e o soberano entre os homens.

10.28 Sou o raio (vajra) 39O raio (vajra) é tido como a arma de Indra desde os tempos védicos. entre as armas. Entre as vacas, sou aquela que atende a todos os desejos 40A mitológica vaca que atende a todos os desejos é chamada de kāma-dhuk., e procrio Kandarpa 41Kandarpa, nascido da mente de Brahma, é um dos muitos nomes do deus Kāma (“Desejo/Luxúria”). Segundo a lenda, imediatamente depois de nascer, ele perguntou a Brahma “A quem devo orgulhar?” (kam darpayāmi), e Brahma transformou a pergunta no nome de seu filho recém-nascido. A oração prajanashcāsmi kandarpah talvez esteja corrompida. Pelo menos um manuscrito traz prajaneshvapi kandarpah, “das [ou: entre as] criaturas, sou Kandarpa”.. Sou Vāsuki 42Vāsuki, a grande serpente, foi usada como corda durante o processo de agitar o oceano primordial. Os deuses seguraram um lado da corda e os antideuses (titãs), o outro. entre as serpentes.

10.29 Entre os Nāgas 43Os Nāgas são as serpentes com cabeça humana que, segundo se relata, habitam no subterrâneo ou no fundo das águas e guardam os tesouros da Terra, ou o que resta deles., sou Ananta 44Ananta (“Infinito”), também chamado Shesha (“Resto”), é o rei dos Nāgas, de mil cabeças. Serve de leito para o repouso de Vishnu.. Sou Varuna 45Varuna, grande divindade do início da era védica, era adorado na era purânica como senhor das águas. entre os habitantes das águas e Aryaman 46Aryaman (“camarada”) é um dos Ādityas (ver a nota 15 em 10.21) e também o chefe dos antepassados (pitri). entre os antepassados. Entre os subjugadores, sou Yama 47Yama (“Ordenador”) é o Deus da Morte..

10.30 E sou Prahlāda 48Prahlāda, filho do rei-demônio Hiranyakashipu, ficou famoso por sua devoção a Vishnu, o maior inimigo de seu pai. entre os Daityas 49Os Daityas são os descendentes de Diti, filha de Daksha Prajāpati (o Criador) e uma das esposas do sábio Kashyapa. Todos os filhos dela são antideuses ou titãs (asura), concebidos por mera luxúria e em horários desfavoráveis, ao passo que todos os filhos de sua irmã Aditi são deuses (sura). A palavra diti sugere a ideia de restrição ou limitação.. Sou o Tempo entre os que [o] computam, o senhor dos animais [ou seja, o leão] entre os quadrúpedes e Vainateya 50Vainateya, famoso filho de Vinatā (uma das esposas de Kashyapa), é mais conhecido como Garuda, meio homem e meio águia. É a montaria de Vishu. entre as aves.

10.31 Sou o vento entre os purificadores. Sou Rāma 51Rāma, aqui, é Rāmacandra, uma das encarnações divinas de Vishnu e herói do épico Rāmāyana. entre os que portam armas e o crocodilo entre os monstros aquáticos.

10.32 Além disso, ó Arjuna, sou o princípio, o fim e o meio de [todas as] criações. Entre as ciências, [sou] a ciência da base-do-eu. Entre os falantes, sou a fala.

10.33 Sou a letra A entre as letras e dvandva 52Sobre o termo dvandva (“pares-de-opostos”), ver a nota 19 em 2.15. no sistema de compostos [gramaticais]. Em verdade, sou o tempo imperecível. Sou o sustentador, com as faces voltadas para todos os lados.

10.34 Sou também a morte que tudo devora e a origem dos acontecimentos futuros. Entre as [palavras] femininas, sou fama, fortuna, palavra, memória, inteligência, perseverança e paciência.

10.35 Além disso, entre os cantos, sou o grande canto 53O “grande canto” (brihat-sāma) consiste em versículos do Sāma-Veda compostos na cadência brihat, que tem 36 sílabas (4 versos = 8 + 8 + 12 + 8 sílabas).; entre as cadências, a gāyatrī 54A cadência gāyatrī (3 versos x 8 sílabas = 24 sílabas) é a empregada no versículo mais famoso do Rig-Veda (3.62.10) – famoso por ser diariamente recitado até hoje pelos brâmanes piedosos.; entre os meses, sou mārgashīrsha 55A estação de mārgashīrsha (novembro-dezembro) deriva seu nome daquele da constelação mriga-shiras (“cabeça do veado”).; entre as estações, a “mina de flores”. 56A expressão poética kusuma-ākara significa literalmente “mina de flores”, ou seja, abundância de flores, e refere-se à primavera.

10.36 Sou a jogatina dos trapaceiros. Sou o esplendor dos esplendorosos, a vitória, a determinação 57O termo vyavasāya, traduzido aqui por “determinação”, também pode ser vertido como “resolução” (como em 9.30) ou “vontade”.. Sou o sattva 58Sobre sattva, ver a nota 36 em 2.37. dos dotados de sattva.

10.37 Sou Vāsudeva 59Vāsudeva significa “filho de Vasudeva”. Já Vasudeva significa “Deus [de Todas as] Coisas”, nome do pai de Krishna. entre os Vrishnis 60Os Vrishnis são uma tribo da dinastia solar à qual Krishna pertencia. Vrishni era o nome de um famoso governante dessa dinastia, que se originou do próprio Vishnu., Dhanamjaya 61Sobre o epíteto Dhanamjaya, ver a nota 7 em 1.15. Aqui, Krishna afirma ser o próprio Arjuna. entre os filhos-de–Pāndu 62Os Pāndavas são os cinco filhos – Arjuna e seus irmãos – do rei Pāndu, que era seu pai humano “oficial”, casado com a rainha Kuntī. Na verdade, os pais dos Pāndavas foram cinco divindades.. Além disso, sou Vyāsa entre os sábios e o bardo Ushanas 63Ushanas, filho do sábio Bhrigu (ver 10.25), já é mencionado no Rig-Veda (8.23.17). entre os bardos.

10.38 Sou a vara dos verdugos, a arte de governar dos sedentos de-conquistas. Sou, ainda, o silêncio dos segredos, o conhecimento dos dotados de conhecimento.

«Entre os cereais, sou a cevada. Sou o ouro entre os metais.

Entre as vacas, sou a descendente de Surabhī 64Surabhī é a vaca que atende a todos os desejos (ver acima, 10.28), mãe da bezerra Saubhadrā, que aqui talvez tenha sido confundida com a irmã de Krishna, que tinha o mesmo nome.. Sou a manteiga entre as gorduras. Entre todas as gramíneas, sou darbha, ó deleite de Pāndu 65Pāndunandana (“deleite de Pāndu”) é um epíteto parecido com Kurunandana, usado em 2.41 (ver a nota 40). Esse versículo extra diferencia-se dos demais por ter três versos de 16 sílabas..» 

10.39 E sou também aquela que é a semente [da perfeição] em todos os seres, ó Arjuna. Não há ser, móvel ou imóvel, que possa existir separado de Mim.

10.40 Meus divinos poderes-de-manifestação não têm fim, ó Paramtapa 66Sobre o epíteto Paramtapa, ver a nota 5 em 2.3.. [O que] proclamei acerca da extensão dos [Meus] poderes-de-manifestação foi somente a título de exemplo.

10.41 Quaisquer entidades (sattva) poderosas (vibhūtimat), prósperas ou vigorosas [devem ser] reconhecidas por ti [como] um nascimento fragmentário do Meu [divino] esplendor.

10.42 Mas de que [adianta] para ti conhecer tantos [detalhes], ó Arjuna? Tendo estabelecido todo este universo com um único fragmento [de Mim Mesmo], permaneço [eternamente imóvel].

Notas de Rodapé

  • 1
    Os sete grandes videntes são geralmente identificados como Kashyapa, Atri, Vasishtha, Vishvāmitra, Gautama, Jamadagni e Bharadvāja.
  • 2
    Os quatro Manus (ver a nota 2 em 4.1) fazem parte de uma sequência de quatorze.Os sete primeiros foram Svāyambhuva (o Manu original), Svārocisha, Auttama, Tāmasa, Raivata, Cākshusha e, em sétimo lugar, o Manu Vaivasvata (progenitor da raça humana atual e regente do manvantara, ou Era de Manu, em que vivemos), cujo reinado terminará daqui a uns 2 milhões de anos. Depois dele haverá sete outros Manus, e então o universo desaparecerá completamente com a morte de Brahma, o atual criador. (Svāyambhuva é o legislador mencionado na nota 4 em 5.18.) 
  • 3
    Zaehner (1966) traduz vibhūti como “poder extenso”; Nataraja Guru (1973), como “valor único”; Radhakrishnan (1948), como “glória”; e Edgerton (1944) propõe “manifestação superna”. Hill (1928/1966) comenta com razão que essa palavra “contém uma ideia de ‘poder’ ou ‘senhorio’ e também uma ideia de ‘penetração’ ou ‘imanência’”.
  • 4
    Zaehner (1966) traduz o termo bhāva (“estado-de-existência”), nesse caso, por “caloroso afeto”, enquanto Bhaktivedanta Swami (1983) o traduz por “de todo o coração”. Shankara o explica como bhāvanā paramārthatattvābhiniveśah, ou seja, “cultivo: direcionamento da atenção para a Realidade transcendente”. Entendido como “estado-deexistência”, o termo bhāva denota o estado psicológico de abertura à realidade última, estado esse que é fundamental para o Yoga.
  • 5
    A palavra gata (“ida”, particípio passado [feminino] do verbo “ir”), traduzida aqui como “dissolvida”, também pode significar “absorvida” ou “absorta [em Mim]”. Uma tradução mais devocional da oração inteira seria “a força vital [ou: a vida deles] entregue a Mim”.
  • 6
     O composto buddhi-yoga, não traduzido nesse caso, tem muitas conotações. Refere-se à capacidade yogue de sabedoria ou à capacidade de exercitar, pela graça de Krishna, a faculdade inata da sabedoria.
  • 7
    Nārada, um dos mais famosos sábios mencionados nos Purānas, teve, segundo o épico, sete nascimentos eminentes. Como filho do rei Drumila e da rainha Kalāvatī, recebeu os ensinamentos do bhagavatismo diretamente de Vishnu.
  • 8
    Asita Devala é o nome de um sábio mencionado em outros trechos do Mahābhārata como um dos discípulos de Vyāsa. Ele foi responsável por disseminar o épico entre o público em geral. Edgerton (1944) conclui, erroneamente, que Asita e Devala foram dois sábios diferentes.
  • 9
    Aqui, Vyāsa, criador de todo o Mahābhārata, inteligentemente menciona a si mesmo dentro da sua própria criação.
  • 10
    Sobre o epíteto Keshava, ver a nota 21 em 1.31.
  • 11
    Aqui, Arjuna refere-se a Sri Krishna como o supremo yogin, aquele que realizou e personifica o objetivo máximo do Yoga. (N.T.)
  • 12
    Uma tradução alternativa dessa frase, baseada nas interpretações clássicas: “Em que forma de manifestação [ou: em quais aspectos] devo pensar em Ti, ó Bendito?”. Em seguida, Sri Krishna arrola para Arjuna as diversas formas gloriosas em que se manifesta em todo o universo, formas essas que podem servir de objeto de meditação para o yogin que volta sua atenção para o Senhor Bendito. (N.T.)
  • 13
     Sobre o epíteto Janārdana, ver a nota 25 em 1.36.
  • 14
    Kurushreshtha é um epíteto de Arjuna e significa “O Melhor dos Kurus”.
  • 15
    Sobre o epíteto Gudākesha, aplicado a Arjuna, ver a nota 17 em 1.24.
  • 16
    A palavra āshaya, traduzida aqui como “lugar de repouso”, é derivada da raiz verbal shī (“reclinar”). Esotericamente, refere-se ao coração.
  • 17
    De certo ponto de vista, Vishnu é uma grande divindade solar, o líder dos Ādityas. Os Ādityas, filhos de Aditi (que representa o espaço ilimitado), são as divindades solares  védicas Varuna, Mitra, Aryamat, Bhaga, Daksha e Amsha. Às vezes, enumeram-se doze Ādityas.
  • 18
    Os Maruts, os 21 filhos guerreiros do deus védico Rudra (“Uivador”), são associados ao vento. No Hari-Vamsha (“Linhagem de Hari [Krishna]”), volumoso apêndice tradicional ao Mahābhārata, 24 Maruts são mencionados pelo nome, e outros textos mencionam um número ainda maior.
  • 19
     Marīci, líder dos Maruts, é ligado às tempestades de raios.
  • 20
     O termo nakshatra, geralmente traduzido por “constelações”, refere-se aqui às 27 (posteriormente, 28) mansões lunares (divisões do caminho da Lua na astrologia védica), que correspondem a outras tantas constelações estelares.
  • 21
    Vāsava é um dos nomes de Indra.
  • 22
    A mente (manas) é geralmente chamada de 11º sentido (indriya), pois é ela que processa todos os dados sensoriais.
  • 23
    Shamkara (“Pacificador”) é o primeiro dos Rudras, que geralmente são contados como onze, embora o Mahābhārata (13.984) diga que são 1.100. São, às vezes, identificados com os Maruts. Shamkara também é um dos nomes de Shiva. Ver também a nota 7 em 11.6.
  • 24
    Os Yakshas são espíritos da natureza, geralmente representados como anões barrigudos. O senhor das riquezas (vittesha) é mais conhecido como Kubera.
  • 25
    Os Rākshasas são ogros destruidores que gostam especialmente de interromper os sacrifícios e outras atividades sagradas.
  • 26
    Os oito Vasus (“Habitantes”) são divindades associadas ao espaço e aos elementos. Segundo o Mahābhārata, são Dharā (a terra), Dhruva (a Estrela Polar, que representa as mansões lunares ou constelações), Soma (a Lua), Aha (as águas), Anila (o vento), Anala (o fogo), Pratyūsha (o Sol) e Prabhāsa (o céu).
  • 27
    De acordo com a mitologia hindu, o Monte Meru é a montanha sagrada situada no centro de Jambudvīpa (a ilha habitada, ou seja, a Terra). É o axis mundi (eixo do mundo), feito inteiramente de ouro. Jambudvīpa é um dos sete “continentes” que compõem o universo conhecido. No simbolismo yogue, Meru representa a coluna vertebral, ao longo da qual o “poder serpentino” (kundalinī-shakti) deve subir para que o praticante alcance a iluminação.
  • 28
    Brihaspati (“Grande Pai/Senhor”) é o sumo sacerdote das divindades e é associado ao planeta Júpiter.
  • 29
    Sobre o epíteto “filho-de-Prithā” (Pārtha), ver a nota 18 em 1.25.
  • 30
    Skanda é um dos filhos de Shiva. Divindade guerreira, Skanda é associado ao planeta Marte.
  • 31
    Bhrigu é um dos sábios mais famosos dos tempos antigos. De acordo com a mitologia, esse sábio poderoso ousou dar um pontapé em Vishnu para acordá-lo. Vishnu não se irritou, mas abraçou, amoroso, o pé que o chutara; Bhrigu converteu-se então em fervoroso devoto de Vishnu.
  • 32
    Sobre o monossílabo OM, ou AUM, ver a nota 14 em 8.13.
  • 33
    A árvore ashvattha é a Ficus religiosa, também conhecida como pipal ou figueirados-pagodes. Ver a extensa nota de Hill (1928/1966, p. 185s.) sobre a estrofe 15.1 (citada em parte, abaixo, na nota 1 em 15.1). A ashvatta simboliza o mundo da mudança (samsāra).
  • 34
     Citraratha é o chefe dos Gandharvas.
  • 35
    Os Gandharvas (“Fragrâncias”) são espíritos celestiais masculinos e são associados ao deus do Sol, que muitas vezes é contado como um deles. São viris e, de acordo com a mitologia purânica, benevolentes. São os “anjos guardiães” da música, do canto e da dança.
  • 36
    Kapila é tradicionalmente celebrado como o fundador da tradição do Sāmkhya.
  • 37
    Uccaihshravas é o cavalo de Indra.
  • 38
    Airavata é o elefante de Indra. Como Uccaihshravas, surgiu quando o oceano cósmico foi agitado pelos deuses e antideuses (titãs).
  • 39
    O raio (vajra) é tido como a arma de Indra desde os tempos védicos.
  • 40
    A mitológica vaca que atende a todos os desejos é chamada de kāma-dhuk.
  • 41
    Kandarpa, nascido da mente de Brahma, é um dos muitos nomes do deus Kāma (“Desejo/Luxúria”). Segundo a lenda, imediatamente depois de nascer, ele perguntou a Brahma “A quem devo orgulhar?” (kam darpayāmi), e Brahma transformou a pergunta no nome de seu filho recém-nascido. A oração prajanashcāsmi kandarpah talvez esteja corrompida. Pelo menos um manuscrito traz prajaneshvapi kandarpah, “das [ou: entre as] criaturas, sou Kandarpa”.
  • 42
    Vāsuki, a grande serpente, foi usada como corda durante o processo de agitar o oceano primordial. Os deuses seguraram um lado da corda e os antideuses (titãs), o outro.
  • 43
    Os Nāgas são as serpentes com cabeça humana que, segundo se relata, habitam no subterrâneo ou no fundo das águas e guardam os tesouros da Terra, ou o que resta deles.
  • 44
    Ananta (“Infinito”), também chamado Shesha (“Resto”), é o rei dos Nāgas, de mil cabeças. Serve de leito para o repouso de Vishnu.
  • 45
    Varuna, grande divindade do início da era védica, era adorado na era purânica como senhor das águas.
  • 46
    Aryaman (“camarada”) é um dos Ādityas (ver a nota 15 em 10.21) e também o chefe dos antepassados (pitri).
  • 47
    Yama (“Ordenador”) é o Deus da Morte.
  • 48
    Prahlāda, filho do rei-demônio Hiranyakashipu, ficou famoso por sua devoção a Vishnu, o maior inimigo de seu pai.
  • 49
    Os Daityas são os descendentes de Diti, filha de Daksha Prajāpati (o Criador) e uma das esposas do sábio Kashyapa. Todos os filhos dela são antideuses ou titãs (asura), concebidos por mera luxúria e em horários desfavoráveis, ao passo que todos os filhos de sua irmã Aditi são deuses (sura). A palavra diti sugere a ideia de restrição ou limitação.
  • 50
    Vainateya, famoso filho de Vinatā (uma das esposas de Kashyapa), é mais conhecido como Garuda, meio homem e meio águia. É a montaria de Vishu.
  • 51
    Rāma, aqui, é Rāmacandra, uma das encarnações divinas de Vishnu e herói do épico Rāmāyana.
  • 52
    Sobre o termo dvandva (“pares-de-opostos”), ver a nota 19 em 2.15.
  • 53
    O “grande canto” (brihat-sāma) consiste em versículos do Sāma-Veda compostos na cadência brihat, que tem 36 sílabas (4 versos = 8 + 8 + 12 + 8 sílabas).
  • 54
    A cadência gāyatrī (3 versos x 8 sílabas = 24 sílabas) é a empregada no versículo mais famoso do Rig-Veda (3.62.10) – famoso por ser diariamente recitado até hoje pelos brâmanes piedosos.
  • 55
    A estação de mārgashīrsha (novembro-dezembro) deriva seu nome daquele da constelação mriga-shiras (“cabeça do veado”).
  • 56
    A expressão poética kusuma-ākara significa literalmente “mina de flores”, ou seja, abundância de flores, e refere-se à primavera.
  • 57
    O termo vyavasāya, traduzido aqui por “determinação”, também pode ser vertido como “resolução” (como em 9.30) ou “vontade”.
  • 58
    Sobre sattva, ver a nota 36 em 2.37.
  • 59
    Vāsudeva significa “filho de Vasudeva”. Já Vasudeva significa “Deus [de Todas as] Coisas”, nome do pai de Krishna.
  • 60
    Os Vrishnis são uma tribo da dinastia solar à qual Krishna pertencia. Vrishni era o nome de um famoso governante dessa dinastia, que se originou do próprio Vishnu.
  • 61
    Sobre o epíteto Dhanamjaya, ver a nota 7 em 1.15. Aqui, Krishna afirma ser o próprio Arjuna.
  • 62
    Os Pāndavas são os cinco filhos – Arjuna e seus irmãos – do rei Pāndu, que era seu pai humano “oficial”, casado com a rainha Kuntī. Na verdade, os pais dos Pāndavas foram cinco divindades.
  • 63
    Ushanas, filho do sábio Bhrigu (ver 10.25), já é mencionado no Rig-Veda (8.23.17).
  • 64
    Surabhī é a vaca que atende a todos os desejos (ver acima, 10.28), mãe da bezerra Saubhadrā, que aqui talvez tenha sido confundida com a irmã de Krishna, que tinha o mesmo nome.
  • 65
    Pāndunandana (“deleite de Pāndu”) é um epíteto parecido com Kurunandana, usado em 2.41 (ver a nota 40). Esse versículo extra diferencia-se dos demais por ter três versos de 16 sílabas.
  • 66
    Sobre o epíteto Paramtapa, ver a nota 5 em 2.3.
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